sexta-feira, 1 de abril de 2016

Resenhas com Roberta Basto #Análise do poema “Das Lágrimas”

Análise do poema “Das Lágrimas” de Fiama Hasse Pinto Brandão

DAS LÁGRIMAS
A pequeníssima aranha assusta
a criança que eu estava a olhar,
e chora. «Meu duplo filho,
não temas a intensa labuta
da caçadora de insectos.
Ela estende uma rede, tão frágil
que a podes romper com o menor dedo.
A menos que, antes do gesto, encontres
a beleza do tecido luminoso,
quando a aranha ofende o Sol
roubando-lhe alguns raios,
ou a beleza da água que ela retém,
como diamantes sem preço,
rosácea de lágrimas.»


Primeiramente, deve-se fazer uma constatação sobre a autora. Não é comum fazer referência a biografia da autora na analise de um texto ou um poema, mas para melhor entender as referências e a contextualização histórica de tal produção.
Nessa época não se pode falar de um movimento literário propriamente dito, com características marcantes que identificavam aqueles que produziam as obras de dado tempo por características em comum, assim como o Romantismo, ou “ismos” em geral. Porém, mesmo assim os poetas que publicaram junto à Fiama Brandão formaram a o movimento “Poesia de 61” que não se uniam por nenhum traço, a não ser publicarem juntos (grupos de cinco) para conseguirem pulicar seus textos num mercado literário muito difícil.
Quanto a contextualização histórica, Portugal ainda passava por um momento árduo para os intelectuais, poetas e artistas que lutavam contra o governo salazarista, que aconteceu de  1933 a 1974. Apesar disso, Fiama Hasse já não fazia poesias engajadas e de fórum claramente politico, e anti-ditatorial, assim como seus antecessores que permaneciam em Portugal, assim como Sophia de Mello Breyner.
Em uma leitura primária e geral podemos perceber as imagens gerada pelos personagens do poema, personagens pois tal poema se assemelha a um conto, uma narrativa, por tal motivo não cabe chamar de eu lírico. Esse diálogo entre uma aranha pequenina e uma criança assustada é envolto por imagens belíssimas e de como é bonita a realidade sem ser olhada através do prisma do medo.
Devemos começão nossa análise pelo título: “ Das Lágrimas”, já começamos sem saber o que o título quer dizer em sua totalidade, mentalmente e inconscientemente podemos completar “ a respeito das Lágrimas”, “ a partir das lágrimas” mas por fim percebemos que não estar completo é intencional, é para mexer com o imaginário daquele que lê, já que as lágrimas por sí só já tem natureza dúbia: ora é de extrema alegria na qual as lágrimas brotam dos olhos em meio a uma gargalhada, ora de tristeza.
Nos três primeiros versos podemos notar esse eu-lirico narrador como expectador de uma situação corriqueira, um menino com medo de uma aranha: “ A pequeníssima aranha assusta /a criança que eu estava a olhar,/ e chora”. Esse medido poderia representar a pureza da crianças, mas como já sabemos que Fiama desconstrói os clichês de leituras podemos partir de um outro ponto: que essa criança é simbolo da ignorância diante de um outro ser tão frágil. Portanto, não devemos ver a criança como a pureza, mas como símbolo da ignorância que mesmo diante de tão pequeno animal se vê assombrado pelo medo do desconhecido.
Seguindo em nossa análise minuciosa, chegamos a um vocativo importante para todo o poema, quando a aranha o chama de “Meu duplo filho”, duplo filho por ela se tratar de um animal feminino, ela como essência representando o feminino, além de um tratamento terno e paciente, assim como um adulto fala a uma criança com afeto; “ Meu filho, não faça isso.”. Sendo assim, a aranha continua seu discurso: “Meu duplo filho,/ não temas a intensa labuta /da caçadora de insectos.” literalmente falando, ela pede que ele não tema sua teia e que é o fruto de seu trabalho, porém podemos ver um outro sentido quando ela  pacientemente explica que o menino, a ignorância,  não precisa vir envolto do medo e logo em seguida ela explica o motivo “ Ela estende uma rede, tão frágil /que a podes romper com o menor dedo.”, podemos então perceber um paralelo com a vida, a vida é o trabalho que o feminino dá ao mundo e com ela a efemeridade e fragilidade que lhe cabe, portanto ela é como uma teia, que ao menor toque pode se desfazer.
“A menos que, antes do gesto, encontres/ a beleza do tecido luminoso,/ quando a aranha/ ofende o Sol / roubando-lhe alguns raios,/ ou a beleza da água que ela retém,” Aí podemos revisitar a beleza da vida que está captada em alguns momentos assim como esse de iluminação de uma gotícula de água presa numa teia de aranha funcionando como prisma que espalha as diversas cores que o sol pode formar assim como o diamante também exerce a mesma função. Quanto a questão do sem preço diz respeito da inestimabilidade da vida diante de um tempo tão conturbado era o momento ditatorial em que ela vivia.
Então, por fim chegamos o ultimo verso no qual é despertada uma rosácea de lágrimas, esse verso apresenta tamanha polissemia e consegue transformar todo o poema, podem ser rosácea de lágrimas que brotam na face do menino, como simbolo da ignorância prefere continuar na escuridão e o discurso da aranha foi em vão, podem ser causadas pelo menino à aranha, até porque ouve uma personificação se ela pode falar ela também pode chorar, por lembrar-lhe como é belo os pequenos momentos, assim como a gotícula resplandecendo o sol em meio a deus frutos de labuta, seus filhos.
Portanto, o que podemos perceber que podemos procurar conforme nossa vontade os sentidos ocultos e encontra-los mesmo não estando lá. Podemos buscar um significado oculto tanto biográfico, como interpretar como a dificuldade da vida em um momento de ditadura partindo da biografia da poeta, quanto de temas genéricos como a efemeridade da vida e a captação de momentos simples como simbolo de algo maior,  Mas o que podemos atestar com segurança é a preocupação com a linguagem, tal polissemia do texto era intencional, era motivador, O trabalho de Fiama é  trabalhar a linguagem pra nos deixamos cheios de certezas e em crise com elas ao mesmo tempo.

Espero que tenham gostado.
Beijos

RobertaBasto

2 comentários:

  1. Que poder ver um análise de um poema em português. Muito bom pra quem está estudando! Valeu :)

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Que bom que gostou! No Cantinho da Meninice tem uma de Pessoa também. :) Beijinhos e obrigada!

      Excluir